terça-feira, 30 de novembro de 2010

Um notícia cheia de rítmo e felicidade


Os Afoxés agora são considerados patrimônio imaterial da Bahia. Esta notícia carrega um enorme apelo sobre a resistência vivênciada pelos negros brasileiros na manutenção de seu sustentáculo cultural.

A presença dos Afoxés no carnaval brasileiro é marcante, principalmente, por sua tradução da mais evidente negritude - contemplando a religiosidade e a musicalidade africanas - com uma beleza envolvente e emocionante.

Quem, como eu, já pode se arrepiar ao desfilar em um Afoxé, tocando o ritmo Ijexá e cantando em Iorubá, sabe que esta experiência supera a manifestação carnavalesca: é a celebração da vida. A vida que é vivida na contramão das mazelas impostas ao povo negro brasileiro nos últimos séculos.

O Afoxé é acima de tudo nossa história viva!

Axé,Romilson.

No G1 de hoje, 30 de Novembro:

Afoxés faz parte do patrimônio baiano

O desfile dos Afoxés agora faz parte do Patrimônio Cultural Imaterial da Bahia. O decreto foi assinado hoje de manhã na câmara municipal de Salvador. Os grupos passam a ser reconhecidos oficialmente e a manifestação cultural é preservada.

O Afoxé Filhos de Gandhi é um dos mais famosos e tem 60 anos. Reúne mais de dez mil integrantes no carnaval de Salvador.

FOTO: Afoxé Omó Orunmilá de Ribeirão Preto

domingo, 21 de novembro de 2010

Redescobrindo The Smiths



A voz inconfundível de Steven Morrisey e o timbre marcante das guitarras de Johnny Marr formam o DNA da banda inglesa The Smiths. Um clássico dos anos 80 que redescobri dia destes, sem querer, quando buscava novidades em uma loja de CDS. Fui ao encontro de novidades e acabei ficando com uma coletânea do velho Smiths: The Very Best of The Smiths, lançado em 2001.

Com suas letras carregadas de uma poética que traduzia as dúvidas de uma geração próxima da adolescência e que buscava descobrir seus caminhos - diante de transformações bombásticas nos comportamentos - os Smiths foram o registro de um tempo no qual grandes revoluções foram preparadas e acabaram por ter seu lugar na década seguinte! Chamado pela imprensa inglesa de alternativo o grupo influenciou mais de uma geração de bandas de todo o mundo.

Os títulos das músicas, por vezes quilométricos, já apresentam uma ideia do que espera o ouvinte que quiser curtir alguma nostalgia ou que se atrever a conhecer o som destes ingleses de Manchester. Clássicos estão disponíveis no The Very Best…: The Boy With the Thorn In His Side , There Is a Light That Never Goes Out , Please, Please, Please, Let Me Get What I Want e I Know It´s Over, são alguns deles.

Ouvindo o CD me lembrei de um grande amigo que me apresentou a banda, Jorginho Fagundes. Lembro-me, também, da curiosidade em entender as letras. Esta curiosidade muito me ajudou no estudo do inglês e me fez um admirador, mesmo que não fanático, de um som que – para mim – tem gosto dos belos tempos da adolescência na serra de Nova Friburgo.

Romilson Madeira

Descobrindo Ilana


Pensar, traçar e dar vida a formas diversas e encantadoras.

Este é o trabalho de Ilana Volcov, arquiteta de formação. Arquiteta da música e arquiteta da emoção. A palavra sempre foi sua companheira, sua cúmplice mais inspiradora. Com a palavra, ela reinventa o sentido do termo musicalidade. Amplia o entendimento do que é “ser musical”.

Ilana admite que o significado e a sonoridade das palavras sempre foram um fascínio para ela. Nos últimos anos, tem pesquisado a modinha, gênero musical português, que tem sua influência marcada no cancioneiro popular brasileiro até os dias de hoje e que reforça este seu fascínio pelas palavras e seus sons.

Segundo o pesquisador Jairo Severiano: "Nascida no Brasil no século XVII, a modinha teve seu primeiro momento de glória na década de 1770, quando foi apresentada na corte de Lisboa pelo poeta, compositor, cantor e violeiro Domingos Caldas Barbosa (1740-1800). O grande sucesso alcançado pelo gênero – denominado modinha para diferenciar-se da moda portuguesa – levou músicos eruditos portugueses a cultivá-lo, só que de forma requintada, adicionando-lhe características da música de ópera italiana. Assim, aproximaram a cantiga colonial das árias portuguesas, praticamente transformando-a em canção camerística. Foi com esse feitio que ela voltou ao Brasil no início do século XIX".

Com uma história rica em participações de destaque no cenário musical brasileiro, como os trabalhos com os grupos Barbatuques e Notícias dum Brasil(com Eduardo Gudin), Ivana se credenciou como uma voz indispensável. Seu sucesso, aliás, foi profetizado pelo consagrado e exigente Guidin que afirma sobre sua vocação de revelar talentos: “Porque é para ser assim: apresentar pessoas que sei que farão sucesso e não estarão mais disponíveis”.

Do seu engenho, o Banguê (nome do seu primeiro trabalho solo), nasce uma sonoridade ímpar com cheiro de cana, cheiro do Brasil. Uma receita fantástica com o tempero do ecletismo. Na companhia de Paulinho da Viola, Caetano Veloso, Capiba e outros mestres, ela deixa mais rico o Brasil musical.

Romilson Madeira

*foto: http://www2.tvcultura.com.br

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O negro é rei no carnaval.Será?

Em tempos de eleições ditas pós-raciais na nação – pelo menos por enquanto – mais poderosa do planeta alguém pode se perguntar: qual a importância de discutir-se a participação do negro no carnaval do Brasil?

O carnaval brasileiro contém, em todos os seus aspectos, o resumo das diferenças sociais, econômicas e políticas que se apresentam na nossa sociedade. Um olhar para suas nuances pode nos ajudar a refletir sobre a condição de desigualdade que atinge os descendentes da mãe África que por aqui habitam. Vamos usar como exemplo as Escolas de Samba. Uma manifestação cultural que tem a evidente participação negra desde suas origens e que rende muitos dividendos aos seus organizadores. Poderíamos afirmar que nestas históricas instituições e no Carnaval, de forma geral, o protagonismo negro é evidente.

Afinal os negros são os grandes artistas do espetáculo: ritmistas, mestre-sala e porta-bandeira, passistas, compositores, intérpretes, etc. Pois bem, paradoxalmente na importância que o negro tem, pelo brilho que empresta ao espetáculo, está a sua enorme ausência nos centros de decisão dos destinos deste grande acontecimento cultural. Raros são os presidentes de Escolas de Samba e dirigentes da organização do Carnaval negros.

O destino carnavalesco de quem carrega o peso do surdo-de-marcação, canta e dança é decidido por outro alguém que tem poder político e econômico. Algo impossível de ser alcançado pelos negros no atual estágio da nossa sociedade. Assim no Carnaval, como em todos os setores da vida do nosso país, o negro tem – historicamente – um lugar à margem dos centros de poder. Não lhe é dada condição de igualdade para que seja comum a sua presença em postos-chave da sociedade (e no carnaval isto se replica fielmente).

Reitores, governadores e cientistas negros? No Brasil a negritude passa longe destas ocupações. Nas terras tupiniquins, ao contrário da suposta fuga da realidade que aparenta representar, o Carnaval imita a vida cotidiana e é retrato fiel dela. Infelizmente.

Romilson Madeira

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Juliana na música brasileira

Diversas Canções no universo da música brasileira exploraram o uso de personagens femininas. Inúmeras composições foram baseadas em nomes de mulheres. Talvez as mais conhecidas sejam, “Amélia” de Ataulfo Alves e Mário Lago, “Lígia” e “Luiza” de Tom Jobim, “Januária” e “Rita” de Chico Buarque e “Tereza” de Jorge Ben Jor.
Curiosamente um dos nomes mais citados no enredo de muitas canções é o de “Juliana”. Ele aparece em vários gêneros diferentes, pronunciado em diversos sotaques, como, Baião, samba, temas instrumentais e música sertaneja.
Começamos pela clássica “ Coroné Antônio Bento” do Maranhense João do Vale e Luiz Wanderley– gravada com grande sucesso por Tim Maia – nela Juliana é filha de um coronel linha dura, que no dia de seu casamento, prefere o piano do carioca Bené Nunes à sanfona nordestina.
Do Maranhão, Juliana foi personagem na Bahia através das canções praieiras de Dorival Caymmi, primeiro em “Juliana” gravada pelo Quarteto em Cy em 1968 e depois em “ Vou ver Juliana” onde um pescador esperava a maré vazar para ver Juliana, já que não tinha dinheiro para atravessar com saveiro. Ainda na Bahia, Gilberto Gil em “ Domingo no Parque” coloca Juliana em uma disputa amorosa entre João e José, na alegórica cena do parque de diversão de interior no trecho: “ Juliana na Roda com João/ uma Rosa e um sorvete na mão/ Juliana, seu sonho, uma ilusão/ Juliana e o amigo João”.
O conjunto carioca A Brazuca, liderado pelos compositores Antônio Adolfo e Tibério Gaspar, lançou em 68 a moderna “Juliana”, onde na letra a personagem transita da adolescência para a maturidade - “ e Juliana então se fez mulher/ e Juliana viu o amor chegar”. Essa canção influenciou o aparecimento de outras Julianas na música brasileira, como, no tema do filme “ Juliana do amor perdido” do compositor e cineasta Sérgio Ricardo e na canção “ Juliana” de Danilo Caymmi e Ana Terra, gravada no disco Cheiro Verde em 77.
O sanfoneiro e compositor Sivuca em parceria com Chiquinho do Acordeom, realçou a beleza do nome na balada “ Acalanto para Juliana”.
Na música instrumental, Juliana foi tema de dois grandes violonistas, “Juliana” de Nando Carneiro, presente no disco “ Violão” e “ O choro de Juliana” de Marco Pereira, faixa do disco “ Violão popular brasileiro contemporâneo.
No universo sertanejo, Juliana foi exaltada pela dupla Tonico e Tinoco em “Juliana” e pelo compositor Rolando Boldrin na moda de viola “ Tema para Juliana”.
Com certeza, deverão existir muitas outras canções por esse Brasil a fora citando esse nome que rendeu tantas inspirações em nossos compositores. E essa quantidade de gravações, prova que Juliana possui uma melodia e uma essência poética inata ao se falar e cantar suas sílabas musicais.

Cesar Garcia

terça-feira, 8 de julho de 2008

AS CRÍTICAS DIVERGENTES DE SILVIO TÚLIO CARDOSO E JOSÉ RAMOS TINHORÃO

Tão importante quanto a música brasileira, foram também os seus críticos. Vale ressaltar a existência de dois críticos que difundiram e perpetuaram a memória musical e o jornalismo cultural brasileiro: José Ramos Tinhorão e Silvio Túlio Cardoso.
José Ramos Tinhorão é conhecido como um “ xenófobo” musical, completamente avesso a influências estrangeiras na música brasileira. Um defensor voraz do samba e do choro como manifestações culturais genuínas. Já Silvio era um apaixonado pelo jazz e um dos principais defensores da Bossa Nova.
Silvio Túlio Cardoso faleceu cedo, aos 43 anos, mais deixou um legado de grandes realizações em prol da memória e da cultura brasileira.
Atuante na cena jornalística, a partir dos anos 40, colaborou como crítico no Diário da noite e na lendária revista Cena Muda de cinema e comportamento. Nos anos 50, foi para o jornal o globo onde se firmou como um dos grandes nomes do jornalismo musical. Sílvio era um eterno apaixonado pelo jazz, e quando viu nascer a Bossa Nova, não demorou a aceita-la e divulga-la através de sua coluna. Não por acaso, integrou a comitiva que viajou a Nova York para o concerto da Bossa nova no Carnegie Hall em 1962.
José Ramos Tinhorão não devia gostar muito da paixão de Silvio pela Bossa, porque pensava justamente o contrário dele. Tinhorão sempre deixou claro sua fama de conservador e defensor do samba carioca de morro, basta atentar para sua vasta produção bibliográfica do gênero.
Tinhorão não gostou do aparecimento da Bossa Nova, justamente o contrário da postura de Silvio, Passando a ataca-la em artigos de jornais, o que culminou na publicação do livro Música Popular um tema em debate. Nele, tinhorão considera a bossa e seus integrantes como cópias do jazz norte – americano. Essa discussão gerou alguns atritos com a rapaziada do movimento. Ronaldo Bôscoli – um dos principais letristas e produtores do gênero – rasgou o livro em público, durante a apresentação de um de seus shows em uma boate na zona sul carioca.
Tirando esse lado radical de Tinhorão, temos um musicólogo sério e importante, devido sua grande contribuição para a bibliografia musical do nosso país. Ele pesquisou e documentou séculos de história, que envolve a linha evolutiva e os desdobramentos das manifestações musicais do Brasil.Apesar das divergências, esse dois críticos podem ser considerados como dois grandes pilares da cultura brasileira do século XX.

Cesar Garcia

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Homenagem a J.T Meirelles


Tardiamente venho prestar uma homenagem ao músico J.T Meirelles. No último dia 5, lendo o caderno Rio do jornal O Globo, me deparei com uma nota de obituário escondida no rodapé do jornal, anunciando o falecimento desse grande instrumentista. No mínimo ele mereceria uma matéria de capa nos cadernos de cultura, mas nossa imprensa não estava muito interessada em realizar esse ato de gratidão.
João Teodoro Meirelles foi um artista raro, compositor, arranjador, saxofonista/flautista, teve enorme importância na música brasileira, desbravando os horizontes da Bossa Nova e consolidando seu nome no exterior.
No ano em que o movimento liderado por João Gilberto completa 50 anos, perdemos um dos seus principais expoentes. Meirelles atuou no cenário da música instrumental dos anos 60, e nessa época a Bossa Nova era a força motriz das orquestras e conjuntos instrumentais.
Meirelles criou juntamente com outros músicos um estilo dentro da Bossa Nova, esse estilo é conhecido como Samba – Jazz, gerado nas lendárias reuniões realizadas no Beco das Garrafas – reduto carioca de boates que tocavam Jazz no início dos anos 60 – e que o teve como principal guia das canjas e improvisos.
Do Beco das Garrafas, Meirelles partiu para os estúdios de gravação e se firmou como um dos mais atuantes arranjadores das gravadoras Philips e Odeon. E foi na Philips que produziu o primeiro disco do Jorge Ben, Samba esquema novo, sendo o responsável pelo arranjo conhecidíssimo de Mais que nada e pela projeção de Jorge. Lançou discos autorais ao longo da década de 60 junto com o seu quinteto Copa 5 formado por cobras da música instrumental, entre eles, o pianista Luiz Carlos Vinhas, o violonista Roberto Menescal, o baterista Edison Machado e o baixista Manoel Gusmão.
No final dos anos 90, o cantor e compositor Ed Motta convidou Meirelles para fazer o arranjo de Bananeira, faixa do songbook gravado em homenagem ao compositor João Donato. Com essa reverência, Ed mostrou-se grato pela influência da escola criada por J.T Meirelles. Em 2002 foi a vez de Max de Castro o convidar para participar da faixa O nego do Cabelo Bom do disco Orchestra Klaxon.
Essa redescoberta das novas gerações lhe rendeu a gravação de um disco pelo selo Dubas de Ronaldo Bastos e uma apresentação na noite de jazz do Tim Festival de 2003.
Meirelles estava sobrevivendo nesses tempos de ostracismo como professor de teoria musical e técnico de informática. Mais um exemplo de que a memória cultural brasileira vive em um constante “ Alzheimer” crônico.Sem dúvida a morte de Meirelles silenciou o som que projetou nossa música instrumental para patamares internacionais.
Cesar Garcia